terça-feira, 28 de agosto de 2012

B Fachada no ALEGORIA DA PRIMAVERVE



BF - Obrigo-me a ser o mais polivalente possível neste aspecto; quando estou a fazer uma canção por um processo que nunca usei fico mais confiante de que o resultado vai ser diferente do que eu já fiz antes. Às vezes começa pela letra, outras pela música, outras ao mesmo tempo, pelo início, pelo meio, pelo fim, já houve canções que começaram por ser uma ideia de forma, outras uma ideia de conteúdo, outras sem ideia nenhuma.
TZ -Tem um disco seu preferido ou responderá que a todos ama da mesma forma, como filhos?
BF - De uma maneira geral, gosto sempre mais do último que fiz, mas há discos pelos quais tenho mais carinho que outros, mas claro que isso tem mais a ver com razões pessoais que musicais.
TZ - Gostava de saber quais são os músicos que mais admira. Três, ou quatro. E, se não coincidirem, dois ou três cantores.
BF - É difícil escolher assim no geral, mas se tentar concentrar-me na música em português posso dizer que o Zeca e o Alfredo Marceneiro em Portugal e o João Gilberto e o Caetano no Brasil são os quatro pontos cardeais do meu "manual da língua cantada".
TZ - Para além de influências puramente musicais, de que outras impressões estéticas, em geral, e artísticas, em particular, retira inspiração para compor?
BF - Principalmente da literatura. É fácil aprender com os grandes clássicos: são as melhores lições de forma, língua, narração e narrador.
TZ - A arte tem propósito ou é despropositada por natureza?
BF - A arte não tem propósito. Começa e acaba em si: a leitura é que tem propósito. Apesar disso, não considero a música pop uma arte, mas sim uma espécie de artesanato e esse já tem um propósito: representar um espaço e um tempo (da humanidade) muito curtos e com uma grande intensidade. Para que possa ser absorvido por inteiro e ser substituído facilmente pelas gerações seguintes”
[excerto da entrevista].

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

B Fachada "Criôlo" (Texto de Apresentação)

Foi preciso esperar até 2009 para se identificar mais objectivamente a crioulização em B Fachada: primeiro no reggae ‘Kit de Prestidigitação’, com que fechava o seu álbum homónimo, e, determinantemente, no akizombado ‘Monogamia’, a sua contribuição para a compilação “Novos Talentos”, da Fnac. Depois, no Verão de 2010, surgia em “Há Festa na Moradia” um ‘Joana Transmontana’ a equilibrar toada ultramontana com uma batida relaxada extraída ao semba. Mas, mais do que numa justaposição elementar, todo esse EP reflectia uma certa noção de amálgama miscigenada no âmago do seu material, para não falar já, em termos mais gerais, no seu método.

“B Fachada é Pra Meninos”, o CD de 2010, embora num escopo muito específico, abria com um ‘Tó-Zé’ a evocar padrões rítmicos afrobrasileiros e confirmava a predisposição espiritualmente tropicalista na abordagem de tradições alóctones que, no Verão do mesmo ano, “Deus, Pátria e Família” confirmou em pleno, com a sua cadência caribenha temperada por sintetizadores sacados ao livro de estilo de bandas congolesas. A leitura parecerá apócrifa, certamente. E muitos mais casos na sua extensa discografia apontam em direcção contrária. Mas servirá para transmitir esta ideia de que – em pensamento – havia já na produção de B Fachada um ideário crioulo antes de um álbum chamado “Criôlo”.

Esse – do inventivo balanço de ‘Afro-Xula’ (que, em tese, pega numa síncope angolana para marcar uma toada da chula, a dança do Alto Douro que marcou a música nordestina brasileira, a que, por isso mesmo, se contrapõe um acordeão a evocar forró) ao dub de ‘Quem Quer Fumar com o B Fachada’ (que saúda um Lee Perry que, basta ouvir ‘I Am the Upsetter’, não era estranho ao malhão) – torna agora explícito um certo interesse por aquilo que, para descrever influências latino-americanas no flamenco, por exemplo, os espanhóis chamam de canções de “ida y vuelta”. Mas, numa triangulação entre Portugal, Brasil e África Lusófona, não interessando a ordem de partida, “Criôlo” não deixa de ser também um disco sobre essas relações e a ausência dessas relações ao longo dos anos. Utilizando quase exclusivamente sons fora de moda, ou pelo menos dessintonizados com o presente, o disco especula sobre uma crónica dificuldade na generalidade da música popular portuguesa em assimilar organicamente e generosamente, que não em regime de anedotário ou mimese, a música do atlântico sul (mesmo se de semelhante processo floresceu toda a mais significativa produção do século passado: tango, fado, samba, blues, rumba, jazz, r&b, afrobeat, etc).

Simulando arranjos que em tempos serviram a mais genérica música de massas, Fachada sugere ainda a possibilidade da música popular não ter de depender exclusivamente da sobrevalorizada expressão de autor (num país onde por vezes parecem só haver casos e não movimentos). Mas, embora paradoxal, é também sintomático que o sublinhar dessas diferenças entre o popular e o tradicional, o individual e o colectivo, o rural e o urbano, etc, reafirme a sua própria assinatura individual. A um CD de terminar o plano de edições em vigor desde 2009, com referências ao 25 de Abril ou às possibilidades sinecuristas no exercício do poder misturadas com vinhetas do quotidiano, não sabemos se faz pensar, mas dançar, sim, com certeza.

B Fachada no SOL