Na apresentação de Tó, desvenda-se biografia, cronologia e geografia:
“‘Guitarra 66’ parte da minha data de nascimento e cruza-a simbolicamente com a Route 66 – tem essa ambiência de estrada, embora seja calma e exótica. É um pequeno exercício de nostalgia.
‘Pinacoolata’ é, estilisticamente, mais comunicativa. É uma variação sobre um tema latino-americano e vejo-a muito nas ruas, numa presença quase rufia e desafiante. Mas se a linha de baixo se mantém aí, o resto começa a ficar mais denso e nublado, um pouco como revisitar um passado longínquo.
‘Traffic’ tem um tema mais abstracto e é de difícil execução técnica. Há muito movimento, muitas variações de tempo, pausas inesperadas e, subitamente, o aproximar de uma melodia muito dolente, meio praeira. Mas tudo se mexe num remoinho que tanto nos coloca no ponto de partida quanto nos distancia do conhecido.
‘Spanish Letters’ canta as saudades de Espanha. Gosto de ter Espanha aqui ao lado. Partir estrada fora, com o calor, subir até Barcelona e descer pela costa. Sempre achei lindíssimo aquele som de guitarras românticas no flamenco. É algo possível apenas num país de uma certa dimensão. Parto e regresso a elementos associados à técnica do flamenco, mas é um tema mais de pátio, de sombra no pico do calor, quase classicista numa certa ideia de tradição mediterrânica, dos madrigais – mas são apenas impressões disso.
‘Rua da Inquietude’ é um tema que tinha há muitos anos. Imaginava sempre qualquer coisa de filme mudo por entre eléctricos de Lisboa ou algo do género. É uma espécie de pequeníssima viagem na minha terra. No disco, possui quase uma lógica de interlúdio.
‘I Love You Air’ é a balada. O título tem um trocadilho, porque primeiro pensava na forma em como gosto de adormecer a minha filha fazendo-lhe festas no cabelo (hair, em inglês), mas a passagem do gesto para o som da guitarra é muito etérea – assim, usei a palavra para “ar”.
‘The Road to Aït Benhaddou’ evoca uma estrada lindíssima que parte em Marraquexe e atravessa o Atlas. Foi uma viagem incrível e quero voltar a fazê-la. São grandes paisagens, aqui tão perto de nós. No disco é o primeiro tema em que aparece percussão. Inclui espanta-espíritos, chocalhos, vasos, madeiras, mas sempre a reforçar um ambiente algo misterioso. Os acordes também vão surgindo no tema como os quilómetros na estrada, com variações mínimas e quase abertos até ao infinito.
‘Old Times on the Balcon Jack’ relembra-me acordar em Nova Iorque com uma longa manhã pela frente. Encontro-lhe ecos de um certo período, do Marlon Brando no ‘Há Lodo No Cais’, por exemplo, de se fazer a barba em camisa interior de alças. O tema não acaba, suspende-se.
Em ‘The Wind Blows’ encontro memórias de planícies varridas pelo vento, de paisagens desfocadas. É muito solitário. Cheira um pouco a terra. E está ali, a certa altura, entre blues e country.
‘Ponzo’ tem o som da chuva. É rural, de uma aldeia perdida. A melodia está entre a Ilha do Fogo e o México, entre a morna e os mariachi, mas num dia de chuvada, com lama por todo o lado.
‘Esmoriz’ – foi onde gravei o disco, com o mar do norte a bater com força nos pontões ao longe. É um tema muito português.
A fechar está ‘Electric Marrakesh’ – é muito aberto, novamente com uma percussão muito livre e solta. Há melodias que se impõem, mas a estrutura não as prende – como na cidade, em que se mistura o medieval, o religioso, o pagão, o mundo árabe, tudo numa praça. É um tema do observador descomprometido que acaba por respirar por inteiro o ar de um sítio diferente”.
“‘Guitarra 66’ parte da minha data de nascimento e cruza-a simbolicamente com a Route 66 – tem essa ambiência de estrada, embora seja calma e exótica. É um pequeno exercício de nostalgia.
‘Pinacoolata’ é, estilisticamente, mais comunicativa. É uma variação sobre um tema latino-americano e vejo-a muito nas ruas, numa presença quase rufia e desafiante. Mas se a linha de baixo se mantém aí, o resto começa a ficar mais denso e nublado, um pouco como revisitar um passado longínquo.
‘Traffic’ tem um tema mais abstracto e é de difícil execução técnica. Há muito movimento, muitas variações de tempo, pausas inesperadas e, subitamente, o aproximar de uma melodia muito dolente, meio praeira. Mas tudo se mexe num remoinho que tanto nos coloca no ponto de partida quanto nos distancia do conhecido.
‘Spanish Letters’ canta as saudades de Espanha. Gosto de ter Espanha aqui ao lado. Partir estrada fora, com o calor, subir até Barcelona e descer pela costa. Sempre achei lindíssimo aquele som de guitarras românticas no flamenco. É algo possível apenas num país de uma certa dimensão. Parto e regresso a elementos associados à técnica do flamenco, mas é um tema mais de pátio, de sombra no pico do calor, quase classicista numa certa ideia de tradição mediterrânica, dos madrigais – mas são apenas impressões disso.
‘Rua da Inquietude’ é um tema que tinha há muitos anos. Imaginava sempre qualquer coisa de filme mudo por entre eléctricos de Lisboa ou algo do género. É uma espécie de pequeníssima viagem na minha terra. No disco, possui quase uma lógica de interlúdio.
‘I Love You Air’ é a balada. O título tem um trocadilho, porque primeiro pensava na forma em como gosto de adormecer a minha filha fazendo-lhe festas no cabelo (hair, em inglês), mas a passagem do gesto para o som da guitarra é muito etérea – assim, usei a palavra para “ar”.
‘The Road to Aït Benhaddou’ evoca uma estrada lindíssima que parte em Marraquexe e atravessa o Atlas. Foi uma viagem incrível e quero voltar a fazê-la. São grandes paisagens, aqui tão perto de nós. No disco é o primeiro tema em que aparece percussão. Inclui espanta-espíritos, chocalhos, vasos, madeiras, mas sempre a reforçar um ambiente algo misterioso. Os acordes também vão surgindo no tema como os quilómetros na estrada, com variações mínimas e quase abertos até ao infinito.
‘Old Times on the Balcon Jack’ relembra-me acordar em Nova Iorque com uma longa manhã pela frente. Encontro-lhe ecos de um certo período, do Marlon Brando no ‘Há Lodo No Cais’, por exemplo, de se fazer a barba em camisa interior de alças. O tema não acaba, suspende-se.
Em ‘The Wind Blows’ encontro memórias de planícies varridas pelo vento, de paisagens desfocadas. É muito solitário. Cheira um pouco a terra. E está ali, a certa altura, entre blues e country.
‘Ponzo’ tem o som da chuva. É rural, de uma aldeia perdida. A melodia está entre a Ilha do Fogo e o México, entre a morna e os mariachi, mas num dia de chuvada, com lama por todo o lado.
‘Esmoriz’ – foi onde gravei o disco, com o mar do norte a bater com força nos pontões ao longe. É um tema muito português.
A fechar está ‘Electric Marrakesh’ – é muito aberto, novamente com uma percussão muito livre e solta. Há melodias que se impõem, mas a estrutura não as prende – como na cidade, em que se mistura o medieval, o religioso, o pagão, o mundo árabe, tudo numa praça. É um tema do observador descomprometido que acaba por respirar por inteiro o ar de um sítio diferente”.