segunda-feira, 31 de dezembro de 2012
Norberto Lobo nas listas de Melhores do Ano
quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
terça-feira, 13 de novembro de 2012
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
sexta-feira, 9 de novembro de 2012
B Fachada, Minta e João Correia "Os Sobreviventes" (Texto de Apresentação)
Tem tanto por se lhe pegar
mas comecemos pela duração: esta reconstrução/recriação/o-que-quiserem do
primeiro álbum de Sérgio Godinho, gravado em França em 1971 e editado em
Portugal há 40 anos, realizada agora por B Fachada, Francisca Cortesão e João
Correia a convite do seu autor (e “ter a
sua aprovação é bom demais para pôr em palavras”, diz o João) soma cerca de
15 minutos à original. O que quererá dizer muitas coisas mas, crucialmente, prova
que na sua matéria poéticomusical mais básica mas nem por isso menos canónica
encontrou o trio uma invulgar plasticidade e aquelas invejáveis células que,
mais do que reprodução, permitem uma expansão.
Não será propriamente de
estranhar. Primeiro, porque tendo crescido com a música de Sérgio Godinho já
nos anos 80, nenhum deles ignora esse percurso que abraçou o ecletismo sem
jamais comprometer um estilo francamente pessoal; segundo, porque lhe
identificam um impulso de renovação e diálogo intergeracional ao longo da
carreira que desperta a própria chama da transformação; terceiro, porque no
espírito de “Os Sobreviventes” encontram, já mais do que uma ânsia, a própria
promessa da liberdade (e a capacidade de a questionar) com que nasceram; quarto,
porque lhes seria impossível desonrar tudo isso ao se coibirem de imprimir
nestas canções algumas das marcas da agenda criativa contemporânea de cada um. A
isto alude Fachada quando explica: “descobrir
a canção abstracta a partir da versão de 71 e reconstrui-la na nossa língua foi
o estudo mais eficaz que podíamos fazer com o património de Godinho. Fazê-lo de
maneira a que o próprio reconheça não só a música dele mas também a nossa faz
tudo valer a pena”.
Somando a biografia
artística de B Fachada, Francisca Cortesão (líder dos Minta & the Trout
Brook, que ainda há pouco lançaram “Olympia”, e colaboradora do próprio Godinho
em “Mútuo Consentimento”) e João Correia (cantor e guitarrista dos Julie &
The Carjackers de “Parasol”, mas também parceiro de Frankie Chavez, Márcia ou
Walter Benjamin, por exemplo) ter-se-á uma ideia do campo de possibilidades que
logo à sua frente se estendeu. Fundamentalmente, talvez por serem já tão
experientes estes três músicos que ainda não chegaram aos trintas, aquela de experimentarem
um som de banda num contexto habitualmente – em discos de versões – mais
abrangente e variado (diz a Francisca: “a
ideia de ter o mesmo grupo de músicos a fazer versões de um disco inteiro
pareceu-me maravilhosa”).
Claro que a Francisca e o
João são companheiros na aventura They’re Heading West, que partiu mesmo para o
oeste norte-americano na altura destas sessões, conforme recorda a cantora: “eu e o Joca tínhamos voo marcado para
Vancouver, onde começava a nossa digressão. Tanto que o Fachada ainda acabou
algumas coisas sozinho... Ou seja, fomos seguindo os primeiros instintos e
fazendo o que nos soava bem. Também por isso só canto voz principal na ‘Paula’”).
Juntos, possuem uma afinidade rítmica tão intuitiva que por vezes sugerem estar
a tocar o mesmo instrumento – até as síncopes e os contrapontos parecem feitos
pela mesma pessoa. Mas são também, enfaticamente neste contexto, compositores e
vocalistas de direito próprio que tornam cada nota essencial e cada silêncio
não menos fulcral na sóbria gestão do espaço que da sua acção discorre. Fachada,
com uma visão particularmente coral e contramelódica dos arranjos, estimula
mais ainda esta leitura colectiva. E que a sua voz e a de Francisca se
harmonizam elegantemente já se sabia desde ‘Primeiro Dia’, o tema do álbum “B Fachada
é Pra Meninos” em que cantam juntos.
Sérgio Godinho, que já
subiu ao palco com Fachada e Francisca no Super Bock em Stock de 2010, teve
aqui um papel ideológico: foi ele que os desafiou a pegar na sua herança.
Francisca sintetiza-a assim: “Tenho um respeito
sem fim pelos que o gravaram no exílio. Que quem ouça a nossa versão aproveite
para ir ouvir o original e também o “Margem de Certa Maneira”, do Zé Mário, e
os LPs do Zeca da mesma altura. Temos muito a aprender com estes discos”.
Será inevitável – e um dos méritos desta revisão, embora outro seja o de acentuar
características sensuais em temas de intervenção – aplicar palavras escritas em
tempo de ditadura àquele de regime democrático em que vivemos. Mas mais
importante será sempre sobreviver.
sexta-feira, 26 de outubro de 2012
segunda-feira, 22 de outubro de 2012
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
terça-feira, 9 de outubro de 2012
Norberto Lobo "Mel Azul" (MBARI 16)
“Mel Azul”, depois
de “Pata Lenta” (2009) e “Fala Mansa” (2011), é o terceiro álbum do Norberto
para a Mbari. E, desconhecendo o futuro (acção que neste tempo de tantos
augúrios, de tão rara, parece ter-se elevado a arte), foi apenas com a sua
chegada que despontou uma ideia de trilogia jamais planeada (embora, à cautela,
aqui devêssemos utilizar a palavra tríptico). Porque de facto, numa impressão
reforçada por uma certa coerência gráfica e visual no objecto (crucialmente, mas
não só, através da reprodução nas suas capas de quadros do pintor Michael
Biberstein), não trai uma organização muito lógica esta aparentemente clássica disposição
– embora, reforçamos, de todo premeditada – que parte a princípio da solitária guitarra
acústica, dela um pouco se distancia (com a chegada de voz, tambura, piano e
demais teclados em overdub no CD do
ano passado) e em última instância a ela torna (apesar de no tema titular vir
acompanhada por Sei Miguel).
Claro que aos
olhos de quem, do Norberto, conhece apenas estes discos e está atento a um
discreto discurso que nunca sugeriu uma precedência do compositor face ao
intérprete, se revelará absurda uma introdução formal nestes termos: afinal,
não nasce tudo da guitarra? A resposta a esta questão – ou a impossibilidade de
o fazer em termos absolutos – comprova também a singularidade de um percurso
que se revela, normalmente em palco e fruto de frequentes colaborações, muito
mais abrangente do que à primeira vista parece. Pois nessas apresentações se diluem
fronteiras e hierarquias – entre géneros, egos, instrumentos e ideologias – e se
reforça a impressão de que, senão em duas frentes, a música do Norberto se faz,
pelo menos, em duas velocidades: uma, mais imediata, reactiva e instável,
manifesta-se habitualmente ao vivo, em duos e variadíssimas formações (com
bateristas, saxofonistas, pianistas, etc); outra, mais durável, reflectida e
constante, regista-se, por exemplo, neste trio de discos.
Não havendo uma
prevalência de um modelo sobre outro (mais depressa se falará na velha ideia de
dualidade expressa pela gasta expressão dos “dois lados da mesma moeda”), será
importante ter consciência da correlação de forças entre si, e, naturalmente,
de que nem isso terá grande permanência numa compreensão mais vasta desta
produção. Da mesma maneira, será inevitável falar do passado (e daquelas
sessões com Devendra Banhart, Naná Vasconcelos ou Larkin Grimm) e, no máximo,
supor que a partir de anteriores experiências algo agora se projectou. Porque
parte das canções que o Norberto reúne em “Mel Azul” nasce dessa combinação de
efeitos de acumulação e magnetismo. De uma incessante prática e de uma forma
concentrada de constituir num organismo vivo os materiais melódicos, harmónicos
ou técnicos previamente ensaiados, mas também as pessoas e os lugares. Nessa
perspectiva, este novo álbum, ficamos com essa impressão, afigura-se como a
mais elementar tradução de um tempo e um espaço específicos realizada pelo
Norberto desde a sua estreia com “Mudar de Bina” (2007).
“Mel Azul”, como
o que lhe antecedeu, tem tanto de culto quanto de oculto. Após um “Fala Mansa”
em que esteve só, Norberto regressa a interpretações (de dois temas do seu
irmão, Manuel, que todos conhecem de meia dúzia de filmes, certamente do
“Tabu”, e de que só alguns terão ouvido a obra enquanto Garcia da Selva ou REC
brutus, um dueto com Marco Franco) e colaborações (desta feita com Sei Miguel,
com quem partilha maturados interesses). Traz, por isso, música sobre música,
sobre gente e sítios. E, mais uma vez, aprofunda um fraseado independente de
constrangimentos formais que, só por prazer, assume momentâneas estruturas
canónicas. Numa arquitectura progressivamente mais leve, com um sentido de
tempo que nem se dá por ele, tecendo uma malha transparente em que se inscreve
o silêncio, o humor e hipnóticos padrões que jamais soam forçados, esta música
insólita parece-nos próxima por tão familiar nos ser já o seu criador. Mas é
muito feita de inquietações só suas. E avança por caminhos que, sem ela,
dificilmente estaríamos a trilhar. É que, ao contrário do que é comummente
promulgado, nada disto alguma vez aconteceu e dificilmente tornará a acontecer.
Norberto Lobo, guitarra
Sei Miguel, pocket
trumpet em “Mel Azul (Moebius)”
Canções por Norberto
Lobo excepto “Enzo Fought Back” (Manuel Lobo) e “Lisboa Ginásio” (Manuel Lobo
& Norberto Lobo)
Gravado, misturado e masterizado no Golden Pony Studio (Lisboa) por Eduardo Vinhas e Pedro Magalhães
Gravado, misturado e masterizado no Golden Pony Studio (Lisboa) por Eduardo Vinhas e Pedro Magalhães
Design por Mackintóxico Capa por Michael Biberstein, “Target”, 2011
Enzo Fought Back
Lúcia Lima
Vudu Xaile
Valsa da Greve Geral
Rustenburger Str
A Cor do Demo
Rua da Palma Blues
Golden Pony Blues
Lisboa Ginásio
Maga Raga
Mel Azul (Moebius)
sexta-feira, 5 de outubro de 2012
sexta-feira, 21 de setembro de 2012
quinta-feira, 20 de setembro de 2012
domingo, 16 de setembro de 2012
sábado, 15 de setembro de 2012
segunda-feira, 10 de setembro de 2012
segunda-feira, 3 de setembro de 2012
sábado, 1 de setembro de 2012
terça-feira, 28 de agosto de 2012
B Fachada no ALEGORIA DA PRIMAVERVE
BF - Obrigo-me a
ser o mais polivalente possível neste aspecto; quando estou a fazer uma canção
por um processo que nunca usei fico mais confiante de que o resultado vai ser
diferente do que eu já fiz antes. Às vezes começa pela letra, outras pela
música, outras ao mesmo tempo, pelo início, pelo meio, pelo fim, já houve
canções que começaram por ser uma ideia de forma, outras uma ideia de conteúdo,
outras sem ideia nenhuma.
TZ -Tem
um disco seu preferido ou responderá que a todos ama da mesma forma, como
filhos?
BF - De uma
maneira geral, gosto sempre mais do último que fiz, mas há discos pelos quais
tenho mais carinho que outros, mas claro que isso tem mais a ver com razões
pessoais que musicais.
TZ - Gostava
de saber quais são os músicos que mais admira. Três, ou quatro. E, se não
coincidirem, dois ou três cantores.
BF - É difícil
escolher assim no geral, mas se tentar concentrar-me na música em português
posso dizer que o Zeca e o Alfredo Marceneiro em Portugal e o João Gilberto e o
Caetano no Brasil são os quatro pontos cardeais do meu "manual da língua
cantada".
TZ - Para
além de influências puramente musicais, de que outras impressões estéticas, em
geral, e artísticas, em particular, retira inspiração para compor?
BF -
Principalmente da literatura. É fácil aprender com os grandes clássicos: são as
melhores lições de forma, língua, narração e narrador.
TZ - A
arte tem propósito ou é despropositada por natureza?
BF - A arte não
tem propósito. Começa e acaba em si: a leitura é que tem propósito. Apesar
disso, não considero a música pop uma arte, mas sim uma espécie de artesanato e
esse já tem um propósito: representar um espaço e um tempo (da humanidade)
muito curtos e com uma grande intensidade. Para que possa ser absorvido por
inteiro e ser substituído facilmente pelas gerações seguintes”
[excerto da entrevista].
segunda-feira, 27 de agosto de 2012
sexta-feira, 24 de agosto de 2012
quarta-feira, 22 de agosto de 2012
sexta-feira, 10 de agosto de 2012
quinta-feira, 9 de agosto de 2012
sexta-feira, 3 de agosto de 2012
quinta-feira, 2 de agosto de 2012
B Fachada "Criôlo" (Texto de Apresentação)
Foi preciso esperar
até 2009 para se identificar mais objectivamente a crioulização em B Fachada: primeiro no reggae ‘Kit de Prestidigitação’, com que
fechava o seu álbum homónimo, e, determinantemente, no akizombado ‘Monogamia’, a sua contribuição para a compilação “Novos
Talentos”, da Fnac. Depois, no Verão de 2010, surgia em “Há Festa na Moradia”
um ‘Joana Transmontana’ a equilibrar toada ultramontana com uma batida relaxada
extraída ao semba. Mas, mais do que
numa justaposição elementar, todo esse EP reflectia uma certa noção de amálgama
miscigenada no âmago do seu material, para não falar já, em termos mais gerais,
no seu método.
“B Fachada é Pra
Meninos”, o CD de 2010, embora num escopo muito específico, abria com um
‘Tó-Zé’ a evocar padrões rítmicos afrobrasileiros e confirmava a predisposição espiritualmente
tropicalista na abordagem de tradições alóctones que, no Verão do mesmo ano,
“Deus, Pátria e Família” confirmou em pleno, com a sua cadência caribenha
temperada por sintetizadores sacados ao livro de estilo de bandas congolesas. A
leitura parecerá apócrifa, certamente. E muitos mais casos na sua extensa
discografia apontam em direcção contrária. Mas servirá para transmitir esta
ideia de que – em pensamento – havia já na produção de B Fachada um ideário
crioulo antes de um álbum chamado “Criôlo”.
Esse – do inventivo
balanço de ‘Afro-Xula’ (que, em tese, pega numa síncope angolana para marcar
uma toada da chula, a dança do Alto Douro que marcou a música nordestina
brasileira, a que, por isso mesmo, se contrapõe um acordeão a evocar forró) ao
dub de ‘Quem Quer Fumar com o B Fachada’ (que saúda um Lee Perry que, basta
ouvir ‘I Am the Upsetter’, não era estranho ao malhão) – torna agora explícito
um certo interesse por aquilo que, para descrever influências latino-americanas
no flamenco, por exemplo, os espanhóis chamam de canções de “ida y vuelta”. Mas, numa triangulação entre
Portugal, Brasil e África Lusófona, não interessando a ordem de partida, “Criôlo”
não deixa de ser também um disco sobre essas relações e a ausência dessas
relações ao longo dos anos. Utilizando quase exclusivamente sons fora de moda,
ou pelo menos dessintonizados com o presente, o disco especula sobre uma
crónica dificuldade na generalidade da música popular portuguesa em assimilar
organicamente e generosamente, que não em regime de anedotário ou mimese, a
música do atlântico sul (mesmo se de semelhante processo floresceu toda a mais
significativa produção do século passado: tango, fado, samba, blues, rumba,
jazz, r&b, afrobeat, etc).
Simulando arranjos
que em tempos serviram a mais genérica música de massas, Fachada sugere ainda a
possibilidade da música popular não ter de depender exclusivamente da
sobrevalorizada expressão de autor (num país onde por vezes parecem só haver casos
e não movimentos). Mas, embora paradoxal, é também sintomático que o sublinhar dessas
diferenças entre o popular e o tradicional, o individual e o colectivo, o rural
e o urbano, etc, reafirme a sua própria assinatura individual. A um CD de
terminar o plano de edições em vigor desde 2009, com referências ao 25 de Abril
ou às possibilidades sinecuristas no exercício do poder misturadas com vinhetas
do quotidiano, não sabemos se faz pensar, mas dançar, sim, com certeza.
sábado, 28 de julho de 2012
quarta-feira, 25 de julho de 2012
segunda-feira, 23 de julho de 2012
terça-feira, 17 de julho de 2012
sábado, 14 de julho de 2012
terça-feira, 19 de junho de 2012
domingo, 17 de junho de 2012
sexta-feira, 15 de junho de 2012
domingo, 10 de junho de 2012
sexta-feira, 8 de junho de 2012
quinta-feira, 7 de junho de 2012
sexta-feira, 1 de junho de 2012
Éme "Gancia" (STREAMING E DOWNLOAD GRATUITO)
Este “Gancia” é o
primeiro álbum de um artista a solo no seio da Cafetra. E, numa repentista
tangente entre folclore onírico e pop fantasista, aquele que, num contexto de música
popular, consegue, sem renunciar ao equilíbrio entre imediatismo de
procedimentos e pungência emocional que parece ser comum ao ideário dos colegas
de editora, sugerir os mais inesperados caminhos. Diz o Éme: “acho que este disco é importante para a
Fetra porque é o primeiro longa-duração que se afasta do espectro de rock
abrasivo a que, provavelmente, mais pessoas tiveram acesso e a que imediatamente
nos associaram. Mostra também que nunca pensámos na Fetra como um colectivo com
ideias inequívocas ou consensuais mas antes como um espaço em que se acolhem e complementam
as ideias de cada um”.
O espírito colectivista
da Cafetra tem sido, aliás, um dos principais motores para os elogios
granjeados pelos seus activistas, principalmente num meio em que muitas vezes
se mistifica esse valor com propósitos sinecuristas. Um álbum de um escritor de
canções parece contrariar essa ética, mas Éme é claro: “Nas canções que faço há sempre
trabalho que não é meu – até porque é a observação dos outros o que lhe dá o
mote. Por isso, este "Gancia" é meu e de amigos meus… na gravação,
mistura, masterização, execução e tudo o que se possa imaginar. Em casa do Luís
Gravito (Cão da Morte), com a presença regular do Leo (Kimo Ameba, Go Suck a
Fuck, Rabuh Mastah, Putas Bêbadas) e do Filipe Sambado (Cochaise), com os
toques finais do B Fachada, conseguimos o som que tudo isto pedia: caseiro mas
nunca demasiado áspero ou duro. Este som, que dá a vida final aos arranjos e às
canções, parece-me uma das coisas que faz deste disco um objecto algo singular”.
Surpreendente é também o
ambiente relativamente espartano em que respiram parte destas canções. Às vezes
basta um dedilhado – ora mais narcótico, ora mais neurótico – ou um pedal para suster
a estrutura de cada tema. Também isso foi uma preocupação: “tentámos não dar às canções mais do que o
que elas pediam. Não nos interessou a grandiosidade da instrumentação ou o seu
sentido épico. Nos temas de "tom mais confessional" (pior expressão),
fazer o arranjo foi escolher apenas o essencial de um grande número de ideias e
a partir daí construir o estritamente necessário. Tudo o que estivesse a
mais ficava mal”.
É nesse quadro de inegável
sobriedade que sobressaem as características melódicas e harmónicas de Éme. Mas
também nesse particular ele partilha o mérito: “uma das coisas mais importantes do disco é a voz da Júlia. As harmonias
que a Júlia ouve são especiais e mais ninguém as podia fazer. Soam naturais
porque são mesmo. Não há truques, é mesmo assim”.
“Gancia” é a vulnerável revelação de um autor que começa a querer desvendar/(re)inventar
os mistérios do mundo a partir de um quarto e de uma audiência de meia dúzia de
amigos, mas que, pela mais pura honestidade artística, quer também tudo isso
transcender: “o que posso dizer mais é
que estou muito entusiasmado com este disco. É um disco de que gosto muito e é
também um disco que me dá muito espaço para progredir. Espero fazê-lo nos
próximos”.
Ouvir "Gancia" é ver o Éme a partir para o outro lado do espelho.
quarta-feira, 30 de maio de 2012
Os Quais "Meu Caro Amigo Chico" (VÍDEO]
com: PEDRO SÁ, RICARDO DIAS GOMES, VINÍCIUS DE MAGALHÃES, e JOÃO MORAIS gravado nos FANQUEIROS DO SOM por BERNARDO BARATA e JOSÉ DE CASTRO filmado e gravado no contexto do documentário musical "MEU CARO AMIGO CHICO" JBV / LSP 2012
segunda-feira, 28 de maio de 2012
Os Quais "Pop é o contrário de Pop"
Já passaram três anos desde que o rockeiro (pelo menos para os parâmetros bossa-novistas dos que já lhes conheciam
as canções) EP "Meio Disco" fez sair da toca esta dupla. Afinal, o Jacinto e o Tomás, que tocam e
cantam juntos desde os tempos de escola, davam-se a ouvir descontraidamente e não iam mudar de vida só
porque sobre eles se escreveram maravilhas:
“Os Quais fizeram de um meio disco uma ideia inteira”, Nuno Galopim (DN); “O disco inteiro
promete”, João Lisboa (EXPRESSO); “Apenas
seis músicas mas todas elas imprescindíveis”, Frederico Batista (SAPO.pt); “Entre a Lisboa letrada e a enganadora
leveza da música brasileira”, Lia
Pereira (BLITZ); “Tem rocks e pops e bossas e constrói uma ideia de
personalidade”, Mário Lopes (PÚBLICO);
“É «Meio Disco» mas já é muita coisa”, Davide
Pinheiro (DISCO DIGITAL); “A qualidade de um disco inteiro”, Rui Dinis (A TROMPA); “Destes
aventureirismos estamos necessitados”, Gonçalo
Palma (COTONETE).
Mas também porque levaram o desafio à letra, cuidaram
em coligir responsavelmente aqueles materiais que melhor os representavam e
convocar amigos barra-limpa: Domenico Lancellotti (ritmista, cantor, compositor, integrante do trio +2 e baterista de Adriana
Calcanhotto, autor em 2011 do álbum "Cine Privê", em que se inclui a doce
'Os Pinguinhos', canção escrita em parceria com o Tomás), Alberto
Continentino (ás do baixo que tocou com meio mundo no Brasil e que também
grava com Calcanhotto), Ricardo Dias Gomes (da banda Cê de Caetano
Veloso e também da Do Amor), Pedro Sá (guitarrista com vastíssimos
créditos mas actualmente também integrante da banda de Caetano), Bruno
Medina (dos Los Hermanos) ou - em 'Bunganvília' - Péricles Cavalcanti (cantor,
compositor e teórico, com originais gravados desde a década de 70 pelas vozes
de Caetano, Gal ou Arnaldo Antunes); e do lado de cá criaram bases rítmicas no
contrabaixo de Hernâni Faustino e na bateria de Gabriel Ferrandini
(músicos de muitas andanças jazz mas colegas no RED Trio).
O resultado é quintessencialmente quaisiano: letras de quem trabalha a
língua e está habituado a driblar-lhe os convencionalismos, músicas de quem
pinta com olhos de paisagista, focado no panorama geral mas consciente de que deus
e o diabo se encontram nos detalhes.
Péricles Cavalcanti sabe.
E escreveu-nos o PR:
“Há alguns anos, Nina, minha filha, me disse que queria
que eu conhecesse Tomás, um seu amigo português (e de muitos amigos nossos),
artista plástico e também músico (que já havia morado aqui em São Paulo e que agora
estava de volta a Lisboa) que conhecia música brasileira. Bem, não demorou pra
que eu ouvisse algumas gravações dele, com seu parceiro Jacinto, na banda “Os
Quais”.
Imediatamente, mesmo antes de ouvir o som, já gostei
deste nome de banda: sintético, moderno e auto-irônico. Depois fui ouvindo as
gravações, simples, contemporâneas e experimentais e fui gostando ainda mais de
tudo o que elas estavam dizendo. Soube que os “nossos amigos” a que Nina se
referia eram os músicos do “+2”: Moreno Veloso, Kassin e Domenico Lancellotti e
também o guitarrista Pedro Sá, todos, mais ou menos, da mesma geração de Tomás
e Jacinto, e soube, também, que aqueles faziam o som brasileiro atual com que
estes se identificavam mais.
Logo em seguida, eu e Tomás ficamos amigos, via e-mails,
e ele me encomendou uma vinheta com o tema “futurismo” para uma das gravações
do primeiro disco de “Os Quais”. Até que ele veio a São Paulo e, finalmente,
nos conhecemos pessoalmente, conversamos muito e, assim, gostei ainda mais
dele.
Isso tudo, de um modo bem resumido, pra chegarmos até
este novo ‘pop é o contrário de pop”. Minha participação nele começou com o
convite, que eu de pronto atendi, pra dividir os vocais com Jacinto (o que
fizemos via internet) na bela “Buganvília”, canção que ecoa, pra mim, algumas
canções de Caetano Veloso, artista que faz parte do “paideuma” musical da
dupla.
Agora ouço o disco completo e fico mais contente de saber
que, além de levar adiante as “explorações de estilo” do primeiro disco, as
participações nas gravações se estenderam ainda mais, incluindo alguns daqueles
nossos amigos, como por exemplo Pedro Sá, baixo e guitarra, em ‘É adeus”,
canção que, “misturando” jeitos luso-brasileiros, diz, candidamente, “Tchau,
adeus”. Ou Domenico Lancellotti, na bateria, nesta ‘Bandeira”, com melodia tão
bonita, curta e límpida, cuja letra faz uma referência (ou reverência!) sutil
ao grande James Brown e que conta, também, com a participação, entre outros, de
Bruno Medina (de “Los Hermanos”, outra das referências musicais contemporâneas
de ‘Os Quais”) tocando um banjo indiano.
Vale dizer que Domenico é também parceiro de Tomás em
“Quem sabe”, além de participar dos vocais nesta faixa que encerra o disco
realizando uma “ponte transatlântica lírica” com timbres de celesta e um belo e
áspero arranjo de cordas (que lembra o som de rabecas do nordeste brasileiro)
de Miriam Macaia.
Outro “link” mais explícito com a música brasileira está
nesta canção-resposta-enviesada aos “Caros amigos” de Chico Buarque, “Meu caro
amigo Chico” (feita para um filme documentário) em cuja letra são citados,
também, ícones da cultura pop universal, como Paul McCartney e Fred Astaire,
numa faixa que tem a participação, entre outros, do brasileiros Ricardo Dias
Gomes (da banda “Do amor”), no piano Fender Rhodes e em que vale destacar o
ótimo arranjo para metais do português José Castro.
Quando ouço a musica de “Os Quais”, inevitavelmente,
penso nas relações culturais luso-brasileiras, hoje, e é como se Tomás e
Jacinto, incorporando elementos de nossa canção moderna (pós-bossanova) que
tanto lhes interessam, nos devolvessem, nas deles, de uma forma original, a
possibilidade de compreendermos um pouco de nossa própria identidade
poético-musical, que para nós, dentro deste “caldeirão”, parece bem menos
clara. Não foi à toa que Portugal nos legou nossa língua!
Ouça-se, assim, esta emblemática, “Monossilábica”, em que
não há outras participações que não a de Jacinto no vocal e de Tomás, no violão
e na guitarra. Esta canção, uma das minhas preferidas no disco, num certo
sentido filha direta de uma tradição experimental, traz na letra um exercício
lingüístico que, implícitamente, faz uma reflexão sobre o uso pouco usual dos
monossílabos em letras de canções em português (língua com um vocabulário
composto por palavras e expressões mais extensas), característica essa tão
comum em canções na língua inglesa, “naturalmente” mais sintética (o que,
presumivelmente, a tornaria mais flexível para as divisões rítmicas!). E tudo
isso “acompanhado” por um violão swingado, de inspiração tão brasileira e
moderna.
Outra de minhas faixas preferidas, neste disco todo
interessante, é esta “Corpo” que eu já conhecia desde uma gravação-demo
anterior (que Tomás me enviou) e que sempre me chamou atenção pela delicada e
cinematográfica descrição que sua letra faz de um belo corpo feminino, como num
plano seqüência de um dos filmes iniciais da Nouvelle Vague: “mais livre teatro
das formas exatas”. Lindo! E que ótimo baixo acústico, sinuoso e envolvente,
toca o Alberto Continentino, nesta gravação!
“E como poderemos, então, não ver, aí, a beleza!”.
Ouça-se, assim, esta outra faixa, “Duas imagens”, uma composição mais
“universalmente” pop e que com sua estranheza, na entonação da melodia quase-falada
e na letra, por si só, justifica e explica o titulo deste álbum.
É, este pop é mesmo diferente de pop. E não podia ser de
outro modo.
Viva!
Péricles Cavalcanti”
“Pop é o contrário de Pop” – e, enquanto palíndromo, ninguém
pode rebatê-lo – vai para as lojas dia 1 de Junho.
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